Num momento de enfraquecimento do desempenho econômico, a China não pode suportar uma implosão do setor imobiliário, que representa pelo menos 30% do crescimento global.
Nos últimos anos, o setor imobiliário chinês tem sido uma fonte de grande preocupação com a escalada dos preços dos imóveis provocando o temor de um superaquecimento do mercado imobiliário. No entanto, com a desaceleração dos aumentos de preços, parece que a campanha do governo para controlar o risco em propriedades finalmente está surtindo efeito. A ameaça agora é de um possível colapso do mercado imobiliário – levando com eles as perspectivas econômicas da China para baixo.
Em seu esforço para controlar o aumento dos preços da habitação, o governo chinês aplicou nove políticas distintas e nenhuma delas atingiu seu objetivo. Embora políticas como limites em hipotecas para a compra do primeiro imóvel e requisitos de tempo de residência mínima para comprar imóvel em grandes cidades como Pequim ou Xangai tenham ajudado a aliviar a demanda, as táticas de controle da oferta, tais como a limitação de crédito a construtoras e a imposição de novos impostos sobre a venda de imóveis, provaram ser contraproducentes.
Esta abordagem equivocada permitiu que os preços dos imóveis na China, ao contrário, continuem aumentando, alimentando grandes bolhas imobiliárias, especialmente nas cidades de primeiro nível. Em média, um habitante de Pequim teria que economizar toda sua renda por 34 anos para poder comprar um apartamento à vista. Em Xangai e Guangzhou, o equivalente é entre 29 e 27 anos, respectivamente – muito mais do que em outras grandes cidades internacionais.
O receito de que esta tendência continue levou os proprietários a preferirem não vender seus imóveis, embora os valores de aluguel estejam apenas um pouco menos de 2% do valor dessas propriedades no mercado. No entanto, com o setor imobiliário finalmente enfrentando uma crise, chegou a hora de repensar essa estratégia de investimento.
Nos primeiros quatro meses de 2014, as vendas de imóveis diminuíram quase 7% ao ano, enquanto o porcentual de novas áreas construídas caiu mais de 22%. Como resultado, a pressão de queda nos preços dos imóveis está aumentando.
Em tempos normais, esta tendência seria igualmente bem vista pelos cidadãos e pelos funcionários públicos. Mas, num momento de enfraquecimento do desempenho econômico, a China não pode suportar uma implosão do setor imobiliário, que representa pelo menos 30% do crescimento global. De fato, apesar de o governo chinês manifestar sua disposição de sacrificar uma parte do crescimento em sua busca pela reforma estrutural e reequilíbrio, o impacto de um colapso do mercado imobiliário no setor financeiro poderia retardar o crescimento muito mais abaixo do que o limite aceitável.
Tal impacto reflete parcialmente a natureza altamente problemática do tão esperado movimento do governo chinês para liberalizar as taxas de juros. Em vez de atacar o problema diretamente (elevando a taxa de juros impostas aos bancos), o mercado se liberalizou, permitindo o surgimento de atividade bancária paralela. Como resultado, surgiu um grande número de instituições financeiras não bancárias – tais como empresas de gestão de patrimônios e prestadores de serviços financeiros online– prometendo rendimentos elevados a fim de atrair pequenos investidores. Agravando ainda mais a situação, as autoridades monetárias restringiram o fornecimento de crédito, na tentativa de desalavancagem da economia chinesa.
Enquanto tanto a desalavancagem quanto a liberalização da taxa de juros são essenciais para a saúde da economia da China no longo prazo, a escalada dos custos dos empréstimos está deixando muitas companhias de baixo risco, que são incapazes de oferecer altas taxas de retorno, fora do mercado. Ao mesmo tempo, as construtoras que tomaram muito dinheiro emprestado no setor bancário paralelo, com base na suposição que os preços dos imóveis continuariam a subir, lutam para pagar suas dívidas, com a queda acentuada nos preços, inevitavelmente levando à inadimplência. Dado que o setor bancário formal fornece uma grande parte do financiamento bancário paralelo, isso poderia iniciar uma reação em cadeia que afetaria todo o setor financeiro.
Muitos continuam convencidos que o governo chinês – que detém as maiores reservas de divisas do mundo e autoridade praticamente ilimitada – seria capaz de evitar uma grande crise financeira. Mas a crise financeira, na cidade de Wenzhou, desencadeada por empréstimos incobráveis, sugere o contrário – especialmente porque a economia da cidade ainda não se recuperou totalmente. Não há nenhuma razão para se acreditar que uma crise semelhante não poderia ocorrer em escala nacional.
Para evitar tal resultado, os líderes chineses deveriam adotar urgentemente medidas anticíclicas. Eles devem começar eliminando restrições desnecessárias no mercado imobiliário, as quais têm gerado distorções graves, não só na economia, mas também na vida diária das pessoas, de casais divorciando-se temporariamente para ganhar o direito de adquirir um apartamento adicional.
Sobre a questão do setor imobiliário, o governo chinês sistematicamente teve o objetivo certo e a estratégia errada. É hora de alinhar a intenção com ação. Caso contrário, o setor financeiro chinês – e, de fato, toda a sua economia – será afetada.
Yang Yao é Diretor do Centro Chinês de Pesquisa Econômica da Universidade de Pequim.
(Tradução: Roseli Honório)
© Project Syndicate, 2014
Fonte: Veja