O mercado imobiliário passou por uma fase de valorização na primeira parte de 2021 levada, sobretudo, pelos negócios fechados no ano passado — quando a Selic, taxa básica da economia, chegou na mínima histórica –, e pelo impulso de mudança que atingiu diversas pessoas na pandemia.
Se, de um lado, os juros baixos deixaram o momento no último ano extremamente propício para quem queria comprar, de outro, o cenário ficou mais atraente neste ano para quem queria vender. Agora, porém, a situação — que já não estava tão fácil para o primeiro grupo –, deve piorar para todos.
O índice FipeZap, uma das principais referências para os preços de imóveis no Brasil, subiu 0,43% em outubro, mesmo valor de setembro, acumulando alta de 4,23% no ano.
Mas especialistas ouvidos pelo CNN Brasil Business já começam a apontar para um cenário mais desfavorável para quem quer compra e vender imóveis se comparado ao primeiro semestre de 2021.
Os grandes motivadores dessa piora são a alta na inflação e, consequentemente, na taxa básica de juros, a Selic — principal ferramenta do Banco Central para conter os preços. Combinados, os dois fatores tendem a reduzir a demanda pelos imóveis, o que faz com que os preços não subam tanto.
Apesar disso, o momento não é totalmente ruim para quem tem interesse em comprar, já que a expectativa é que a Selic, referência para as taxas de financiamento, suba ainda mais.
Vale dizer que os preços do aluguel também estão em alta, alimentados ou pelo IGP-M ou pelo IPCA, indicador de inflação oficial do Brasil e que está subindo mais que o índice FipeZap.
Os ciclos dos preços de imóveis no Brasil
Sergio Cano, professor da Fundação Getúlio Vargas (FGV), afirma que o mercado imobiliário enfrentou uma forte recessão entre os anos de 2015 e 2017, quando a crise econômica derrubou a demanda.
“Os preços dos imóveis mudam muito em função de algumas variáveis, mas principalmente renda, que está ligada ao emprego e ao salário, e taxa de juros”, diz. Naquele período, o desemprego subiu, a renda caiu e a taxa de juros estava em patamares elevados. Com isso, os preços recuaram.
O cenário foi bem diferente do encontrado entre 2007 e 2014. O período é chamado de “ciclo virtuoso” para o setor por Pedro Tenório, economista do DataZAP+. À época, a Selic não estava tão elevada, o desemprego era baixo, a inflação controlada e a renda alta. Como resultado, o setor teve uma grande expansão, com preços acompanhando a demanda elevada.
A partir de 2018, a economia começou a se recuperar, e a taxa Selic a cair, o que deu início a uma retomada, mesmo que tímida, do mercado imobiliário. “Já em 2019 o mercado estava em elevação pensando em preço e venda. Todo mundo esperava uma recuperação robusta em 2020”, afirma Cano.
Mas a pandemia frustrou essas previsões. O período inicial, com as restrições e paralisação de atividades como obras e estandes de vendas, afetaram duramente o setor e os negócios. Esse cenário durou alguns meses, mas começou a melhorar a partir do segundo semestre.
Para o professor, o principal motivo é que muitas pessoas ficaram mais tempo em casa, e o descontentamento com o imóvel atual aumentou, assim como o desejo de mudança.
O ciclo de baixa também fez com que as variações de preços ficassem abaixo da inflação, aumentando a atratividade e aquecendo o setor no segundo semestre de 2020 em um contexto de Selic em níveis historicamente baixos.
“Os ciclos de preços e vendas são naturais, construir demora um tempo. A pandemia atingiu bem o IPCA, mas para o FipeZap, o que mais impacta é a Selic. Se a taxa de financiamento cai, a demanda sobe e o preços também”, diz Tenório.
O cenário em 2021
O primeiro semestre do ano acabou sendo bastante favorável para o setor. Com a Selic baixa e o desejo maior de mudança, aliadas a um início de recuperação econômica, as vendas subiram, assim como os preços.
“Entrando em 2021, essa recuperação continuou pensando em preço e volumes de vendas, com essa busca mais presente por imóveis, e muita gente migrando de cidade buscando qualidade de vida melhor com a ideia do home office”, afirma Cano.
Com isso, o FipeZap subiu mês após mês, até o pico de 0,64% em julho. A partir daí, porém, ele desacelerou, com altas menores. O movimento ocorreu exatamente em meio às altas do IPCA e da taxa Selic. Para Cano, isso já reflete uma demanda menor.
“A gente já imaginava que, por conta do aumento de inflação e outras variáveis, a taxa de juros subiria no segundo semestre. O que não imaginávamos é que subiria tanto e tão rápido”, diz Cano.
O economista do DataZAP+ afirma que a alta do IPCA segue um contexto de inflação mundial, junto com um desemprego alto e uma demanda maior com a reabertura. Para ele, o fenômeno é momentâneo, mas impacta nos preços dos imóveis.
“Isso significa que os imóveis perderam uma oportunidade de valorização relativa, porque com a alta dos juros que já ocorreu e que vai continuar, o custo para compra vai aumentar”, afirma.
Com isso, a perspectiva dele para 2022 é que o índice FipeZap venha mais fraco, já que haverá um impulso menor da reabertura e juros maiores.
Nesse sentido, Sergio Cano afirma que “quem pode aproveitar para comprar no primeiro semestre teve mais vantagem, encontrou fatores mais favoráveis, com preços ainda abaixo do praticado no período do boom imobiliário até 2014, e taxas de juros e crédito relativamente baixas”.
Para o professor, “isso pode ser negativo para o mercado pensando em 2022, considerando que a Selic e a inflação ainda podem subir mais. A inflação tira poder de compra para a população também”.
Tenório afirma que o contexto atual é desfavorável tanto para quem quer vender quanto para quem quer comprar, mas que é importante ficar atento às dinâmicas em cada estado, cidade e até bairro, já que é possível encontrar particularidades em cada uma dessas esferas e, assim, se deparar com ofertas mais vantajosas.
No acumulado até outubro de 2021, as maiores altas são em Vitória (17,55%), Maceió (14,13%), Florianópolis (12,58) e Curitiba (12,35%), bem acima da média nacional. Já Salvador (1,48%), Rio de Janeiro (1,80%), Belo Horizonte (2,27%) e Recife (3,15%) têm as menores elevações, abaixo da média.
O segundo semestre de 2021 ainda pode ser mais propício para a compra do que os primeiros meses de 2022, por exemplo, em que se espera uma Selic ainda maior. “Ainda é um momento interessante para comprar, os preços já subiram, mas ainda estão se recuperando pensando nos valores no auge até 2014”, diz Cano.
Fonte: CNN Brasil