Direito imobiliário possui limitações

Ser proprietário do imóvel não é poder absoluto e implica em manutenção e função social constantes da propriedade

Bruna Dias

Quando você adquire um imóvel, seja uma casa, apartamento, terreno ou propriedade rural, logo pensa: vou fazer com ele o que eu quiser. Na prática não é bem assim, já que todo imóvel deve ter uma função social. O direito imobiliário foi o tema da palestra ministrada pelo oficial do 1º Cartório de Registro de Imóveis de Bauru, José Alexandre Dias Canheo, no auditório do Sindicato da Habitação de São Paulo (Secovi-SP), em Bauru, nesta semana.

O diretor regional do Secovi em Bauru, Riad Elia Said, salienta que, além do momento ser de reunião de profissionais do ramo imobiliário, é também propício para adquirir mais conhecimento, tendo a oportunidade de abordar um tema tão interessante.

O diretor da área de imobiliárias da regional do Secovi em Bauru, Fernando Pegorin, destaca a funcionalidade do cartório de registros. “É importante que todos que trabalham na área imobiliária e também na área jurídica saibam que só depois de ter o registro de seu imóvel, emitido pelo cartório, é que ele estará regularizado dentro dos procedimentos legais”.

“O imóvel, além de ser um bem, tem função social e direitos. O registro de um imóvel funciona como uma identidade, então, assim como existem os direitos, existem as obrigações também”, acrescenta Canheo.

Afinal, onde começam e terminam as limitações ao direito de propriedade? De acordo com ele, tudo começou com o aprimoramento da Constituição de 1988.

“Sempre se teve uma ideia de que o proprietário de um imóvel tinha um direito absoluto, ou seja, ‘eu faço o que quiser com o imóvel’. Esta visão, nos dias de hoje, já não é mais tão absoluta. Pela Constituição de 88 foi instituído o princípio da função social da propriedade”, explicou.

O princípio da função social da propriedade imobiliária nada mais é, como o próprio nome diz, do que cumprir uma determinada função no espaço da cidade.

“Por exemplo: se é uma propriedade agrícola, ela tem que ser explorada, tem que produzir. Então, a pessoa tem que cultivar, ter criações e tornar essa propriedade produtiva. Já uma casa deve ser destinada a habitação ou a formação de um comércio, por exemplo, para que seja efetivamente utilizada. O que não se admite mais é que uma pessoa tenha uma propriedade que fique abandonada e reservada apenas para especulação”, esclareceu Canheo.

Reclamações

Dentre o ranking das reclamações e reivindicações da população recebidas diariamente na Redação do Jornal da Cidade estão a falta de conscientização de vizinhos e problemas com terrenos baldios, que são foco para a reprodução do mosquito Aedes aegypti, uma vez que o local acumula lixo e torna-se propício para o inseto.

As sanções a esses proprietários têm como subsídio a lei federal intitulada Estatuto da Cidade, que disciplina a utilização de imóveis urbanos. No entanto, só funciona a partir do momento em que exista uma legislação municipal regendo essa situação.

“Existem várias políticas que o município pode adotar por lei. Por exemplo: no caso de um terreno, a prefeitura pode instituir um aumento progressivo do IPTU se esse terreno ficar muito tempo desabitado. Ou seja, se a pessoa não dá um destino para esse terreno, ano a ano ela poderá pagar IPTU mais caro, podendo chegar ao ponto de edificação compulsória”, revelou o oficial de cartório.

No caso da edificação compulsória, o município pode entrar com uma ação na justiça para que o proprietário construa uma edificação até determinado prazo determinado por um juiz. Ou então, o próprio município constrói e onera futuramente o proprietário do terreno.

Lei para todos?

A lei federal do Estatuto da Cidade não é válida para todos os municípios, porque como cada um define as leis que deverão ser cumpridas no espaço urbano, nem todos se disciplinaram neste aspecto. O problema não é só o abandono. O abandono é que acaba por tornar-se uma mola propulsora para uma infinidade de problemas: desavenças entre vizinhos, queimadas e depósito de doenças. “Cabe ao município disciplinar isso”, destacou o oficial do 1º Cartório de Registro de Imóveis de Bauru, José Alexandre Dias Canheo.

Terrenos baldios

O órgão responsável por fiscalizar terrenos baldios em Bauru é o Centro de Controle de Zoonoses (CCZ). O serviço ocorre com periodicidade aliada à demanda de reclamações. Quando o fiscal encontra alguma irregularidade, como lixo ou mato alto, o proprietário é inicialmente notificado para se regularizar dentro do prazo legal de 15 dias.

Depois deste período, se o serviço não for realizado, o proprietário é imediatamente multado. O valor da sanção varia de R$ 150,00 a R$ 3,5 mil, conforme a gravidade do problema.

Após o vencimento, se a multa não for paga, é diretamente enviada para a Dívida Ativa do Município. Isso não significa que o proprietário estará isento de quitar o débito, no entanto, passa a ser devedor da prefeitura. Com o tempo, juros são acrescidos ao montante da dívida.

Patrimônio pode ser desapropriado

Em casos de imóveis que possuem valor significativo para o município, estes podem ser tombados administrativamente. “O proprietário continua sendo dono do imóvel, mas não pode alterar nenhuma característica física. Então, é uma outra forma de limitação de direito de propriedade”, frisou o oficial do 1º Cartório de Registro de Imóveis de Bauru, José Alexandre Dias Canheo.

Segundo o oficial do cartório, outra maneira que explica porque os proprietários de imóveis não são donos absolutos é a desapropriação. Esta medida pode ser aplicada em alguns casos, como em edificações que estejam construídas em lugares estratégicos. “Se ali pudesse existir uma escola, posto de atendimento e não existe nenhum outro imóvel que tem as características que o meu tem, o interesse público é maior que o particular. A prefeitura vem e usa da desapropriação, ou seja, tira a propriedade daquela pessoa e paga a indenização para a instalação de um serviço público”.

O mesmo é válido para terrenos. Quando a prefeitura necessita construir uma rua, avenida, ou outro prédio público no local, este também é desapropriado.

Falha na legislação facilita abandono

Não há uma lei específica que iniba o abandono de imóveis em Bauru. Segundo Paulo Mattos, diretor do departamento de uso e ocupação do solo da Secretaria Municipal de Planejamento (Seplan), existem duas problemáticas clássicas na cidade: a sujeira nesses imóveis e as ruínas.

A primeira torna-se um assunto de saúde também, uma vez que imóveis abandonados e sujos atraem ratos, baratas e mosquitos como o Aedes aegypti, vetor da dengue, e o palha, transmissor da leishmaniose. “Se o imóvel está sujo, nós notificamos a Saúde e expedimos um ofício para o proprietário. Geralmente é a Saúde que faz a limpeza”, disse.

Em casos de imóveis muito antigos, que não são alugados e muito menos reformados por conta de entraves familiares, é sugerida a reforma ou a demolição.

“Nós estipulamos um prazo para ter essa readequação, caso isso não ocorra, tentamos via judicial. Não existe uma lei formal que force isso, mas nós comunicamos o risco e procuramos a Justiça”.

Fonte: JCnet

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