Valor médio do metro quadrado em Brasília e em São Paulo supera o de cidades como Frankfurt e Hamburgo. Economista fala em “bolha”, mas representantes do setor imobiliário discordam.
O aumento do preço dos imóveis nos últimos anos no Brasil vem chamando a atenção de consumidores e de especialistas. Dados divulgados nesta sexta-feira (03/08) pelo Índice FipeZap mostram que o preço de imóveis observados em seis estados brasileiros e no Distrito Federal subiu 17,1% nos últimos 12 meses. Considerando os últimos dois anos, o aumento foi de 49,4%.
De acordo com o índice, nas cidades de São Paulo e do Rio de Janeiro, por exemplo, o aumento dos preços dos imóveis ao longo de um ano ficou próximo dos 20%. Na capital fluminense, o metro quadrado ultrapassou 8,1 mil reais. Para morar no nobre bairro do Leblon, por exemplo, é preciso desembolsar mais de 18 mil reais por metro quadrado – ou seja, 1,8 milhão de reais para um apartamento de 100 m2.
No Distrito Federal, onde segundo o instituto de estatísticas estão os imóveis mais caros do país, em média o comprador paga 8.271 reais por metro quadrado. Em São Paulo, a média é de é de 6,6 mil reais.
Os valores ultrapassam, por exemplo, o preço de imóveis em cidades alemãs onde o custo de vida é considerado alto, como Frankfurt, onde em média o metro quadrado custa 2,5 mil euros (6,25 mil reais) e Hamburgo, 2,6 mil euros (6,5 mil reais). Mas ainda fica abaixo da média em Munique, onde estão os imóveis mais caros da Alemanha, com 3,8 mil euros por metro quadrado (9,5 mil reais), segundo a consultoria alemã F+B.
Caros demais?
“Os preços estão normais, houve apenas uma recuperação de preços nos últimos dois, três anos”, garante Claudio Bernardes, presidente do Sindicato das Empresas de Compra, Venda, Locação e Administração de Imóveis Residenciais e Comerciais (Secovi) de SP. Ele ressalta que o aumento dos valores também deve ser associado ao crescimento do poder aquisitivo da população, à redução das taxas de juros para financiamentos e à ampliação do acesso ao crédito.
Paulo Fabbriani, vice-presidente da Associação de Dirigentes de Empresas do Mercado Imobiliário (Ademi) do Rio de Janeiro, relata que houve um boom da procura por imóveis nos últimos dez anos – o que também justificaria, em parte, os aumentos. “Ninguém fabricou esses preços”, assegura. Segundo Fabbriani, o setor teria sofrido com a falta de incentivo do governo nos últimos 40 anos, o que teria gerado uma demanda reprimida.
“Também nos deparamos com a falta de espaço nas grandes cidades. Se hoje você quiser morar no Leblon, por exemplo, vai ter que comprar o imóvel de alguém que já mora lá. Não há oferta de imóvel novo”, diz o construtor, justificando os altos valores cobrados no bairro nobre carioca.
Risco de bolhaimobiliária?
Enquanto representantes do setor imobiliário são taxativos e garantem que o país não enfrenta uma bolha imobiliária – pelo menos não nos moldes daquela que atingiu os Estados Unidos em 2007 – alguns especialistas mais cautelosos afirmam que aumento dos preços dos imóveis no Brasil é anormal, e o acesso indiscriminado ao crédito, associado à falta de educação financeira do brasileiro, preocupa. E pode, sim, trazer grandes problemas para a economia do país.
“Os preços dos imóveis no Brasil passaram do razoável faz tempo”, garante o economista Samy Dana, da Fundação Getúlio Vargas (FGV). Ele não apenas acredita na formação de uma bolha imobiliária no Brasil como ainda faz uma previsão: ela deve estourar logo após a Copa do Mundo, em 2014.
“E a bolha é caracterizada por um aumento irreal dos preços, ou seja, você paga alto por algo que nunca vai dar retorno por aquele preço”, diz o especialista, ressaltando que comprar imóveis como forma de investimento, no momento, não é aconselhável. “Uma hora os preços vão cair na real, como caíram nos EUA, na Itália, na Espanha, na Grécia. Devíamos tomar como lição a historia recente de países que enfrentaram problemas semelhantes”, afirma.
A diretora da Associação dos Mutuários de São Paulo (Amspa), Ana Carolina Bernardes, também acredita na formação de uma bolha no mercado imobiliário. Segundo ela, a combinação de crédito fácil e demanda crescente pode ser um problema a médio prazo. “Algumas construtoras não pedem nem comprovação de renda, nada, para analisar a vida financeira do comprador. Qualquer pessoa hoje em SP consegue comprar um imóvel”, afirma Ana Carolina.
“Talvez as construtoras nem se preocupem com isso porque, se a pessoa ficar inadimplente, elas retomam o imóvel”, acredita a diretora. Segundo ela, a associação registrou um aumento de 60% no número de reclamações de mutuários nos últimos 11 anos. Mais da metade destes registros é referente a variações na prestação do imóvel, que levam o mutuário à inadimplência.
Já Cláudio Bernardes rejeita qualquer idéia de bolha brasileira. Segundo ele, não há no país as mesmas condições que existiam nos Estados Unidos em 2007. “Nos EUA o sistema de financiamento imobiliário equivale 80% do PIB”, afirma o presidente da Secovi. No Brasil, segundo o Banco Central, este índice é de 5,3%.
Fabbriani acrescenta que os índices de reajuste dos valores dos imóveis nos últimos 10 anos não superaram o de rendimento de outros investimentos neste mesmo período, como, por exemplo, a taxa básica de juros, Selic. Por isso, segundo ele, o risco de bolha estaria afastado.
Excesso de crédito?
Há pouco mais de um mês, o Banco de Compensações Internacionais (BIS, na sigla em inglês), considerado o Banco Central dos bancos centrais, já havia alertado o governo brasileiro sobre os perigos do aumento excessivo de crédito e do endividamento dos brasileiros. A instituição mostrou-se também preocupada com o aumento dos preços do setor imobiliário.
De acordo com o Banco Central, o crédito concedido para financiamento imobiliário nos últimos 12 meses aumentou 39%, chegando a 218 bilhões de reais. Mas a inadimplência, em torno dos 2%, ainda é considerada baixa pelos representantes do setor.
“Crédito mal dado com educação financeira inexistente vão gerar problemas futuramente. As pessoas se comprometem durante 30 anos – muitos casamentos não duram este tempo. E elas fazem um compromisso tão sério quanto um casamento e do qual que não podem sair durante 30 anos. Se sairem, saem sem o imóvel e com nome sujo”, alerta Samy Dana.
Autora: Mariana Santos
Revisão: Augusto Valente
Fonte: DW