Os imóveis de inadimplentes podem ser recuperados pelo credor antes da realização de leilões extrajudiciais, conforme decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ). A Corte entendeu que nos contratos de alienação fiduciária – em que o bem imobiliário é dado como garantia do pagamento – não há necessidade de esperar a venda do imóvel para pedir a reintegração de posse. A decisão foi unânime entre os ministros da 3ª Turma.
Para a relatora do caso, ministra Nancy Andrighi, o destino do bem deve ser econômico quando ocorre inadimplência. “A permanência daquele que promoveu esbulho no imóvel não atende a essa destinação”, disse no acórdão. Até então, o Judiciário tinha posição favorável aos devedores. Ou seja, o bem só poderia ser recuperado depois de leiloado.
Na prática, a decisão significa que o tempo para retomar a posse do bem poderá ser reduzido, assim como os riscos da concessão de crédito imobiliário e dos juros dos financiamentos. O impacto sobre as operações financeiras é interessante. “Para reduzir juros, os bancos mostram a necessidade de ter no mercado mecanismos mais ágeis para recuperação do crédito”, diz Fábio Braga, sócio da área bancária do Demarest & Almeida Advogados. Além disso, com o imóvel desocupado, afirmam advogados, seria mais fácil leiloar o bem com preços próximos ao valor de mercado.
O STJ analisou o tema a partir do recurso de um mutuário de Brasília contra decisão do Tribunal de Justiça do Distrito Federal (TJ-DF), que havia negado seu pedido para impedir que a Via Empreendimentos Imobiliários retomasse a posse do bem. Inadimplente por 14 meses, o mutuário foi notificado para pagar a dívida. Sem receber, a construtora iniciou o procedimento previsto na Lei do Sistema de Financiamento Imobiliário (Lei nº 9.514, de 1997) para retomar o bem.
Primeiramente, registrou em cartório a propriedade do imóvel. A fase seguinte seria realizar os dois leilões extrajudiciais. Entretanto, em novembro de 2008, o mutuário obteve decisão judicial para suspender a hasta pública. A empresa entrou, então, com uma ação para adiantar a reintegração de posse.
Na decisão, os ministros entenderam que uma vez quebrado o contrato de compra e venda, o bem seria do credor. Ou seja, a posse do imóvel seria decorrente da quitação do financiamento. Segundo advogados, a interpretação é importante, pois a Lei do Sistema de Financiamento Imobiliário não é clara sobre a possibilidade de retomar a posse antes dos leilões.
“Não há sentido ter o imóvel em seu nome sem poder tomar posse”, diz o advogado da construtora, Rodrigo Badaró, do Azevedo Sette Advogados. Segundo o professor de processo civil da USP, Paulo Henrique Lucon, o artigo 23 da lei garante ao credor a posse indireta do imóvel durante o financiamento. “Basta ter a inadimplência para recuperá-lo plenamente”, afirma.
Os advogados que representam os mutuários, no entanto, defendem que há diferença entre os contratos de compra e venda e o de garantia do imóvel. Para eles, somente a partir do leilão a dívida poderia ser quitada. Com o débito extinto, o credor poderia pedir a reintegração de posse.
“Sem a posse do imóvel, o cliente fica impossibilitado de discutir o valor da dívida”, diz o especialista em direito imobiliário, Marcelo Tapai, do Tapai Advogados. “A interpretação abriu um precedente tenebroso”, afirma Leandro Pacífico, advogado da Associação Brasileira dos Mutuários da Habitação (ABMH).
As incorporadoras e bancos, entretanto, consideram a interpretação acertada. A diretora-executiva do departamento jurídico da incorporadora Brookfield, Denise Goulart, diz que a decisão abre espaço para a reintegração ser solicitada quando for constatada a inadimplência. Ainda assim, afirma que a empresa continuará conservadora. “Não sei se temos condições de contar com esse precedente na primeira instância”, diz.
Segundo Ana Carolina de Souza Medina, gerente da área jurídica da Gafisa, o contrato firmado com o cliente deve deixar claro que ele terá a posse somente após a quitação do imóvel ou da obtenção de financiamento do saldo devedor. A Caixa Econômica Federal também considerou a decisão acertada, mas afirmou que não haverá impacto sobre a taxa de juros dos financiamentos. (com informações de Valor Econômico)
Por: Redação BNI