Como eliminar a concorrência desleal no mercado imobiliário

A concorrência desleal tem sido um verdadeiro câncer no cotidiano dos corretores de imóveis, sendo a principal reclamação da classe que procura honrar a profissão que foi regulamentada em 1978, pela Lei nº 6.530, a qual determina no artigo 3º que “compete ao Corretor de Imóveis exercer a intermediação na compra, venda, permuta e locação de imóveis, podendo, ainda, opinar quanto a comercialização imobiliária.”

Importante compreender que qualquer pessoa pode vender ou alugar seu imóvel, sendo que somente o exercício constante, ou seja, a prática rotineira da intermediação por pessoa jurídica ou natural é que confere o exercício profissional sujeito à proteção legal e disciplinar do Conselho Federal e dos Conselhos Regionais de Corretores de Imóveis, vinculados ao Ministério do Trabalho, os quais têm autonomia administrativa, operacional e financeira.

Quando um corretor de imóveis ou empresa imobiliária deixa de agir profissionalmente e coloca placa de venda ou aluguel em um imóvel que já tenha propaganda de outro corretor ou imobiliária, de forma a desprestigiar as leis e normas que regulamentam sua atividade, põe em risco a profissão, pois assim estimula a perda de um espaço duramente conquistado diante de uma atitude que lhe retira a credibilidade.

Se o próprio corretor de imóveis não se valoriza, não há como cobrar o respeito do cliente, especialmente se este é estimulado a entregar seu imóvel a vários intermediários, sem qualquer compromisso escrito. O exercício da corretagem consiste numa atividade de grande relevância, onde o profissional é reconhecido pela sua competência na condução da negociação com dignidade, dentro dos preceitos legais que visam à segurança das transações.

Cabe ao corretor de imóveis demonstrar à sociedade o seu compromisso com a lei e com o Código de Ética Profissional (Resolução – COFECI nº 326/92) que determina no seu artigo 3º – “Cumpre ao Corretor de Imóveis, em relação ao exercício da profissão, à classe e aos colegas: I – considerar a profissão como alto título de honra e não praticar nem permitir a prática de atos que comprometam a sua dignidade; […] V – exercer os postulados impostos por este Código, exercendo seu mister com dignidade, VI – exercer a profissão com zelo, discrição, lealdade, probidade, observando as prescrições legais e regulamentares; VII – defender os direitos e prerrogativas profissionais e a reputação da classe; VIII – zelar pela própria reputação mesmo fora do exercício profissional; […] X – não se referir desairosamente sobre seus colegas; XI – relacionar-se com os colegas, dentro dos princípios de consideração, respeito e solidariedade, em consonância com os preceitos de harmonia da classe; XII – … procurar difundi-la a fim de que seja prestigiado e definido o legítimo exercício da profissão.”

A autorização de venda, bem como o mandato de administração de imóveis outorgados às imobiliárias para promover a venda ou locação configuram procuração, onde o proprietário terá os benefícios decorrentes do bom desempenho de seu procurador, no caso, o corretor.

Diante dessa análise constata-se a preocupação do legislador em frisar na lei as qualidades inerentes de uma pessoa que se habilita a ser corretor, conforme as expressões citadas nas normas que regem a profissão: honra, dignidade, zelo, discrição, lealdade, probidade, reputação, consideração, respeito, solidariedade, prestígio e legitimidade.

A Lei existe para proteger o mercado imobiliário

Com o objetivo de gerar segurança para os bons profissionais e para os consumidores, no caso, os vendedores e locadores que contratam a prestação de serviços dos corretores de imóveis, o legislador determinou na Lei nº 6.530/78 o seguinte: “Art. 20 – Ao Corretor de Imóveis e a pessoa jurídica inscritos nos órgãos de que trata a presente lei é vedado: […] III – anunciar publicamente proposta de transação a que não esteja autorizado através do documento escrito; […] VIII – violar obrigação legal concernente ao exercício da profissão; IX – praticar, no exercício da atividade profissional, ato que a lei defina como crime ou contravenção; […]”.

Como eliminar a concorrência desleal no mercado imobiliário
Como eliminar a concorrência desleal no mercado imobiliário

Isso é o pilar do exercício legítimo da profissão de corretor de imóveis. Para evitar qualquer polêmica sobre a força da lei que obriga os corretores a cumprir suas determinações, sob pena de perderem a sua inscrição profissional, esclareço que nas minhas considerações ignorarei a Resolução COFECI nº 458/95 que foi mais contundente, ao proibir a publicação de anúncio de imóvel que não tivesse sido entregue pelo proprietário, de forma exclusiva, para determinado corretor. O artigo 1º da Resolução nº 458/95 estabelece: “Somente poderá anunciar publicamente o Corretor de Imóveis, pessoa física ou jurídica, que tiver, com exclusividade, contrato escrito de intermediação imobiliária.”

Tendo em vista que o texto do artigo 1º da Resolução 458/95 inovou ao condicionar o anúncio ao corretor que detém contrato de intermediação exclusivo, analisarei a questão com base apenas na Lei nº 6.530/78 e no Decreto 81.871/78 que a regulamenta, sendo esses dispositivos legais incontestáveis diante da evidente legalidade conferida pelo Congresso Nacional que aprovou a regulamentação da profissão dentro dos limites constitucionais, previstos no “art. 5º […] XIII – é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer”.

Livre concorrência no mercado imobiliário tem limite

Quanto à questão da concorrência, embora o pressuposto dela seja a liberdade e a livre iniciativa, não significa que ela seja ampla, irrestrita, ou seja, que não possua limitações. Existem restrições emanadas do poder estatal e outras estabelecidas em contrato entre concorrentes. Como exemplo da primeira, podemos citar o Estado que detém o monopólio estatal de fiscalizar a atividade econômica, que define os limites de abrangência de um cartório de Notas e de Registro de Imóveis, etc.

Observar as Leis

Com o objetivo de criar um mercado saudável e ordenado, o Código de Ética determina: Art. 4O “Cumpre ao Corretor de Imóveis em relação aos clientes: I- inteirar-se de todas as circunstâncias do negócio, antes de oferecê-lo; […] III – recusar a transação que saiba ilegal, injusta ou imoral; […] VI – zelar pela sua competência exclusiva na orientação técnica do negócio…; […] IX – contratar, por escrito e previamente, a prestação de serviços profissionais.”

Documento escrito é obrigatório

Tendo em vista que o corretor pode trabalhar com um imóvel somente mediante prévia contratação por escrito, conforme estabelece os três diplomas legais (Lei 6.530 inciso II, art. 20; Decreto 81.871 art. 5º e inciso IV art. 38; o Código de Ética inciso IX do art. 6º), torna-se inaceitável qualquer corretor anunciar ou promover a venda ou locação sem que esteja formalmente autorizado pelo proprietário. A lei nº 6.530/78 e o CC obrigam o corretor a ter em mãos o contrato de intermediação, bem como os documentos que provem ser o imóvel apto à negociação e de propriedade do outorgante, no caso, do vendedor ou locador.

O simples fato do corretor de imóveis promover a venda ou locação sem o contrato de intermediação escrito, desacompanhado do documento do imóvel consiste grave transgressão ética, prevista no art. 8º do Código de Ética Profissional. Se enquadram grave transgressão ética quase todos incisos citados nos artigos 4º e 6º, seja a punição aumentada no caso de reincidência.

Concorrência desleal no mercado imobiliário

Para evitar a concorrência desleal que prejudica a atividade laboral nos mais diversos setores da economia, o Código Penal desde 1940 já determinava penalidade contra quem praticasse atos que visassem a captação de clientes de forma imoral.

O Código de Ética, em sintonia com os incisos VIII, IX 20 da Lei nº 6.530/78 que repudiam ato do corretor no exercício da profissão, que se enquadre como crime ou contravenção penal, detalhou no seu artigo 6o – “É vedado ao corretor: “receber comissões em desacordo com a tabela aprovada… […] VI – angariar diretamente ou indiretamente, serviços de qualquer natureza, com prejuízo moral ou material, ou desprestígio para outro profissional ou para a classe; – VII “desviar, por qualquer modo, cliente de outro corretor de imóveis”; […] X- “praticar quaisquer atos de concorrência desleal aos colegas; […] XV- “aceitar incumbência de transação que esteja entregue a outro corretor, sem dar-lhe prévio conhecimento, por escrito”.

Importante ressaltar que há várias decisões judiciais que abordam a concorrência desleal no mercado imobiliário, sob o enfoque criminal e indenizatório, onde a vítima teve seu direito reconhecido, tendo o corretor infrator sido obrigado a abster-se de prestar serviços para determinado cliente, bem como obrigado a indenizar o colega que foi desrespeitado, mediante o pagamento de perdas e danos.

Indenização independe do CRECI

Diante dos preceitos que regulamentam a profissão de corretor de imóveis, cabe ao Conselho Regional de Corretores de Imóveis (CRECI) garantir o exercício exemplar da atividade, devendo promover mecanismos que inibam práticas contrárias a boa imagem desse profissional que obtém seus rendimentos com base na confiança, já que atua como um procurador.

Os dirigentes do CRECI são os guardiões da profissão, nos termos da Lei 6.530/78, artigo 12 – “Somente poderão ser membros do Conselho Regional dos Corretores de Imóveis com inscrição principal na jurisdição há mais de dois anos e que não tenham sido condenados por infração disciplinar”.

Independente do CRECI, nada impede que o corretor que luta pela dignidade da profissão, promova junto ao Poder Judiciário, o competente processo Penal, e ainda, um processo civil de Obrigação de Não Fazer e de Indenização contra o corretor infrator, com base na Lei nº 9.279 de 14/05/96 que prevê os crimes de concorrência desleal, a qual estipula no “artigo 195 – Comete crime de concorrência desleal quem: I – publica, por qualquer meio, falsa afirmação, em detrimento de concorrente, com o fim de obter vantagem; II – presta ou divulga, acerca de concorrente, falsa informação, com o fim de obter vantagem; III – emprega meio fraudulento, para desviar, em proveito próprio ou alheio, clientela de outrem; IV – usa expressão ou sinal de propaganda alheios, ou os imita, de modo a criar confusão entre os produtos ou estabelecimentos; […] IX – dá ou promete dinheiro ou outra utilidade a empregado de concorrente, para que o empregado, faltando ao dever do emprego, lhe proporcione vantagem; X – recebe dinheiro ou outra utilidade, ou aceita promessa de paga ou recompensa, para, faltando ao dever de empregado, proporcionar vantagem a concorrente do empregador; XI – divulga, explora ou utiliza-se, sem autorização, de conhecimentos, informações ou dados confidenciais, utilizáveis na indústria, comércio ou prestação de serviços, excluídos aqueles que sejam de conhecimento público ou que sejam evidentes para um técnico no assunto, a que teve acesso mediante relação contratual ou empregatícia, mesmo após o término do contrato; XII – divulga, explora ou utiliza-se, sem autorização, de conhecimentos ou informações a que se refere o inciso anterior, obtidos por meios ilícitos ou a que teve acesso mediante fraude; […] Pena – detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano, ou multa”.

Seriedade e respeito

Tendo em vista os diversos artigos legais que protegem a corretagem honesta, leal e respeitosa, não há qualquer empecilho à moralização do setor com a eliminação da concorrência desleal, independentemente da imposição de se anunciar o imóvel somente com contrato de intermediação exclusivo.

Basta verificarmos os preceitos da lei e do Código de Ética, que proíbem no artigo 6º ao corretor: “VI – angariar, diretamente ou indiretamente, serviços de qualquer natureza, com prejuízo moral ou material, ou desprestígio para outro profissional ou para a classe; VII – desviar, por qualquer modo, cliente de outro Corretor de Imóveis; X – praticar quaisquer atos de concorrência desleal aos colegas”.

O corretor que coloca sua placa de anúncio num imóvel já entregue a um colega que ali já instalou sua placa estimula o proprietário a entregar o imóvel para vários corretores de forma irregular e assim denigre a imagem da profissão, além de motivar a redução da comissão. A falta de observância da lei que exige o respeito aos colegas, faz com que o proprietário do imóvel desmereça a categoria e entenda que qualquer um pode prestar o serviço, já que há pouca qualificação.

Cabe ao corretor agir com probidade, ou seja, integridade de caráter e honradez, e exigir que o vendedor ou o locador que já tenha contratado um corretor, primeiramente acerte e encerre com aquele a situação, para que assim possa vir a trabalhar com o imóvel.

Leia também: Ainda há concorrência desleal entre corretores de imóveis

Por: Kênio de Souza Pereira
Presidente da Comissão de Direito Imobiliário da OAB-MG.
Diretor da Caixa Imobiliária Netimóveis
Conselheiro da Câmara do Mercado Imobiliário de MG e do SECOVI-MG
Representante em MG da Associação Brasileira de Advogados do Mercado Imobiliário
Professor do MBA do Mercado Imobiliário da FEAD-MG
Árbitro da CAMINAS – Câmara Mineira de Arbitragem Empresarial de MG.
e-mail – [email protected].

Fonte: Emorar

 

 

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